Se tem dinheiro público envolvido, tem que ter olho em cima! As emendas parlamentares continuam sendo um dos assuntos mais quentes da política brasileira, mesmo com a virada do ano. Enquanto o país segue seu curso, a disputa entre Legislativo e Judiciário pela distribuição desses recursos não dá trégua, nem mesmo no tradicionalmente pacato recesso parlamentar.
E por que isso importa? Porque o impacto dessas emendas no orçamento federal é gigante. Para se ter uma ideia, em 2024, cerca de 19,5% de todo o recurso discricionário da União – aqueles gastos que não são obrigatórios, como investimentos e custeios – foram direcionados via emendas parlamentares. Estamos falando de quase R$ 45 bilhões, de um total de R$ 230,1 bilhões. Esse montante poderia ser investido em grandes projetos, mas acaba pulverizado por todo o país, muitas vezes sem a devida fiscalização.
O Crescimento das Emendas e Seus Efeitos
Se voltarmos alguns anos, veremos que o percentual do orçamento consumido por essas emendas só cresce. Em 2022, representavam 13,8% do dispêndio discricionário; em 2023, saltaram para 16,6%. Nos últimos cinco anos, deputados e senadores movimentaram cerca de R$ 150 bilhões, drenando verbas de ministérios e impactando a capacidade do governo de realizar grandes investimentos estruturais.
Isso cria um efeito colateral preocupante: pastas como Esporte e Turismo, por exemplo, passaram a depender majoritariamente das emendas parlamentares. Só para ilustrar, em 2023, 74% do orçamento do Ministério do Esporte e 69% do Turismo foram decididos pelo Congresso. A questão não é só a destinação do dinheiro, mas a transparência e o controle sobre esse processo.
Falhas na transparência e Indícios de Mau Uso
Se o crescimento das emendas já levanta discussões, a fiscalização do uso desses recursos é um capítulo à parte. A Controladoria-Geral da União (CGU) fez um pente-fino nos municípios que mais receberam verbas via emendas de relator – popularmente conhecidas como “orçamento secreto” – e suas sucessoras, as emendas de comissão, entre 2020 e 2023. O que encontraram? Um rastro de problemas.
Entre os 30 municípios mais beneficiados, cidades pequenas, como Tauá (CE), que tem apenas 61 mil habitantes, receberam montantes milionários. No total, esses municípios embolsaram R$ 788 milhões em quatro anos. Mas o problema não é o destino do dinheiro e sim a falta de transparência na sua aplicação. Quem decidiu? Como foi gasto? Quais os critérios de repasse? As respostas são nebulosas.
A CGU foi além e fez visitas presenciais para verificar o que foi feito com os recursos. O resultado foi preocupante:
- Das 256 obras auditadas, 39% nem saíram do papel;
- 5% estavam paradas e apenas 27% foram concluídas;
- No setor da educação básica, a situação foi ainda pior: das 37 obras previstas, 29 nem começaram.
Outro ponto crítico é o repasse para entidades do terceiro setor. Das 26 organizações que mais receberam empenhos ou pagamentos em 2024, metade não apresentou qualquer transparência sobre o uso do dinheiro, o que levou o governo a suspender os repasses para essas entidades.
O Caso das Emendas “Pix”
Além das tradicionais emendas parlamentares, há um mecanismo relativamente novo que também precisa de atenção: as chamadas emendas Pix – oficialmente conhecidas como transferências especiais. Nessa modalidade, os recursos vão diretamente para as prefeituras sem necessidade de justificar onde serão aplicados.
O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) resolveu investigar como esses repasses estavam sendo usados nos 644 municípios paulistas e descobriu que, até agosto de 2024:
- R$ 831 milhões estavam parados em contas bancárias, sem uso definido;
- 44% dos municípios não tinham um link no Portal da transparência com detalhes sobre os valores recebidos;
- Em uma a cada três cidades, a aplicação desses recursos não foi fiscalizada pelo controle interno municipal.
Sem regras claras e sem fiscalização rigorosa, esse tipo de repasse cria um cenário propício para desperdício de dinheiro público, ineficiência e, claro, corrupção.
E Agora, Como Resolver?
Com tanto dinheiro envolvido e tantos problemas detectados, a necessidade de uma fiscalização mais rígida e transparente nunca foi tão urgente. O aumento do poder do Congresso no direcionamento dos recursos precisa vir acompanhado de mecanismos que garantam que cada real seja bem aplicado.
A CGU, os Tribunais de Contas e o próprio Ministério da Justiça têm intensificado as investigações, mas ainda há um longo caminho pela frente. Para que esse cenário mude, é fundamental que:
- Haja total transparência sobre o destino das emendas;
- Os órgãos de fiscalização tenham autonomia e recursos para monitorar esses gastos;
- O uso do dinheiro seja amplamente divulgado para que a sociedade possa acompanhar e cobrar.
Afinal, estamos falando de dinheiro público. E dinheiro público não tem dono, tem responsabilidade!
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